14 de jul. de 2014

A heterogênea América Latina de Jorge Drexler

Foto: Reprodução




Por Isadora Jacoby


Latino, dançante, poético: em seu décimo disco, Jorge Drexler apresenta um trabalho bastante distinto da sua discografia até então. Como ele mesmo afirma, Bailar en la Cueva se encontra no polo oposto de seus outros discos. Com canções bastante plurais entre si, Drexler fugiu do referencial homogêneo e deixou de lado o conceito linear de seus álbuns anteriores. Em seu novo trabalho, apresentou o tão falado groove latino de maneira totalmente diferente nas onze faixas do disco.



Heterogeneidade pode definir Bailar en la Cueva. Gravado entre Bogotá e Madri, o disco foi executado por diferentes músicos em diversas cidades, o que garantiu uma pluralidade muito interessante entre as faixas. Drexler disse que estava passando por um inverno difícil em Madri e sentiu a necessidade de se reconectar com suas raízes na América Latina. E essa conexão ficou materializada no ritmo latino-americano. Para isso, ele contou com a participação de diversos artistas, como o tropicalista Caetano Veloso; na faixa, Bolivia – homenagem ao país que acolheu o avô, refugiado do nazismo – os compassos do berimbau entoam a participação do baiano. A Bolívia foi o cerne dos novos laços que Drexler estabeleceu com a América Latina; disse que queria que duas coisas do país estivessem em seu disco: o ambiente de acolhida generosa e o groove. Esse esforço é notoriamente percebido ao longo das faixas: dançantes e com muitas participações. Uma delas é a da cantora chilena Anita Tijoux, trazendo mais um elemento plural ao disco: um rap no single Universos Paralelos. No videoclipe da faixa, o convite para bailar fica ainda mais claro na esforçada e sem muita ginga combinação de passinhos do uruguaio. O disco ainda conta com participações de Bomba Estéreo, Calle 13 e Frente Cumbiero. 

Ao contrário do processo de produção de seu trabalho anterior, Amar La Trama (2010), que foi homogêneo, feito de maneira rápida, e que seguia uma linearidade, o novo disco de Jorge Drexler rompe com essa lógica. Para quem ouve o álbum do começo ao fim, fica difícil perceber afinidades entre uma faixa e outra, e até mesmo uma unidade. Talvez seja possível perceber somente uma: ritmo. 
Ritmo, e sua incessante busca, pode ser a segunda definição de Bailar en la Cueva. 

Nos outros discos de Jorge Drexler, a poesia sempre teve destaque; ao contrário das tantas palavras combinadas em Guitarra y vos, do álbum Eco (2004), em Bailar en la Cueva o músico afirmou que tentou fazer canções mais ligadas ao corpo do que a narrativa. Mas Drexler usou a poesia ao seu favor nessa busca pelo groove latino-americano. Embora ele tenha dito que teve que cortar boa parte das letras de todas as canções, para que o foco da música ficasse no ritmo, o sonoro espanhol serve como um instrumento extra em busca da cadência latina. Os instrumentos, aliás, também carregaram na pluralidade do disco. Drexler usou diferentes recursos. Os já conhecidos recursos tecnológicos dos discos anteriores - como na faixa Disneylandia, presente no álbum 12 Segundos de Obscuridad (2006) –, acompanhados de instrumentos tradicionais, como acordeom, e diferentes, como o berimbau. O intuito, atingido, de Drexler é que os instrumentos opostos provoquem novas sonoridades. Por sua definição, o disco foi feito em diferentes lugares do mundo, por diferentes músicos e com diferentes idéias coexistindo.

Jorge Drexler deixa a melancolia de outrora e busca a alegria da dança. E isso, sem dúvidas, ele conseguiu: um disco dançante em (quase) sua totalidade. Drexler contou, em material de divulgação disponibilizado em seu site oficial, que dançar e deixar-se levar pelo ritmo, para quem tem tudo enraizado como ele, faz muito bem. 

Desde seu primeiro disco, lançado em 1992, este é o momento mais pop de Drexler. Músicas mais dançantes – e mais alegres – aproximam o músico de um público mais amplo. Mas Drexler já tem seu espaço consolidado, assim como seu público cativo. O Oscar conquistado com a canção Al Otro lado del Río, em 2005, que fazia parte do longa Diários de Motocicleta, projetou o músico uruguaio mundialmente. A canção foi a primeira em língua espanhola e a segunda em língua estrangeira a conquistar a estatueta. A execução na cerimônia emocionou toda a América Latina, e não foi pela maneira oficialesca como foi apresentada. Na época, a organização da premiação temia que o público não conhecesse Jorge Drexler, e, então, a canção foi executada formalmente por Antonio Banderas e Carlos Santana. Quando recebeu o prêmio, Drexler cantou à capela a canção, fazendo vibrar suas raízes latino-americanas. Pois é este mesmo artista que agora, em 2014, sentiu a necessidade de se reconectar com esta terra, com seu ritmo, com sua cultura. Essa mesma América Latina que ele disse ter realmente conhecido apenas nos últimos quatro anos, em seus shows. Essa América Latina, dançante na caverna de Drexler, talvez mais presente do que nunca nos seus 20 anos de carreira.








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