17 de set. de 2013

Noite do eu sozinho

Por Stefanie Cirne 

O Bar da Mata abre as portas para a comédia stand up em Porto Alegre

A partir das 18 horas, a frente do número 52 é um dos pontos mais iluminados da rua Mata Bacelar, no bairro Auxiliadora, em Porto Alegre. Desde o ano passado, o que parece ter sido uma humilde residência familiar entre a avenida Nova Iorque e a rua anônima atrás do Zaffari da Coronel Bordini abriga o Bar da Mata, o primeiro – e, por ora, também o único – espaço noturno a importar a fórmula made in USA dos comedy clubs para o Rio Grande do Sul. Após o almoço executivo ao meio-dia, o bar reabre aliando música, drinks, petiscos e três apresentações semanais fixas de comédia stand up. As sextas-feiras são os dias dos open mics (abreviação em inglês para “microfones abertos”), quando, além dos comediantes profissionais, os frequentadores assistem aos iniciantes no humor ou simples curiosos mostrarem o que sabem fazer.





Tornar o stand up uma modalidade cômica menos estranha aos gaúchos foi o que motivou a abertura do Bar da Mata. O gerente Jean Carlo Bottega, 30 anos, aproximou-se desse formato quando conheceu o comediante e ex-VJ da MTV Fábio Rabin, no Natal de 2008, em Santa Catarina. Pelos próximos três anos, Bottega acumularia experiência produzindo apresentações do gênero na Cachaçaria da Ilha, em Florianópolis, e traria a ideia na bagagem ao voltar para Porto Alegre. “Parecido com o que se tem no Bar da Mata, o mais próximo que se oferece aqui no sul é o Bar Santa Marta, em Curitiba”, explica. Apesar de estar em funcionamento há relativamente pouco tempo, a proposta está dando certo: na metade da semana, descobri que as reservas de mesa para sexta já estavam esgotadas.

Ao abrir, no ano passado, o Bar da Mata promovia apresentações de música ao vivo e reservava apenas uma noite na semana para a comédia. O estabelecimento fechou durante o verão e passou por reformas também na programação cultural, que passou a ser dedicada exclusivamente ao humor. Desde abril, o gênero é a atração do fim da semana: além dos open mics de sexta-feira, as noites do bar recebem shows de improviso às quintas e o grupo Comédia Urbana aos sábados. Bottega conta que o departamento financeiro também vem registrando movimento crescente: na primeira sexta de open mics, 20 pessoas compareceram; três semanas depois, no dia 17 de maio, o público já passava de 80 pessoas.

Apesar da formação em conjunto, os integrantes do Comédia Urbana apresentam-se individualmente; a organização dos comediantes em patotas serve mais para fins de divulgação e networking. “O stand up é um humor de cara limpa, sem caracterização, sem cenário nem trilha; é o comediante se abrindo para o público em uma conversa, então é um formato mais difícil de fazer as pessoas rirem”, comenta o ator e produtor Eduardo “Dudu” Weber, 31 anos, um dos membros da trupe. A carreira de Dudu como comediante teve início no Bar da Mata há um ano a convite de Donato Oliveira, corretor de imóveis de 31 anos que trabalha com teatro desde 2001. Para ele, além de ser uma oportunidade de explorar a comédia, o gênero é bastante acessível em termos de custos de produção. “Stand up não exige nada além de um microfone. Tu podes apresentar teu trabalho sem depender de nada nem de ninguém. É muito prático, ‘adaptável’ a qualquer espaço”, diz Oliveira.


Desbravando bares nunca dantes animados 

Tendo se iniciado no stand up em 2011, Oliveira conta que, de todos os grandes nomes da comédia local com os quais entrou em contato, está aguardando retorno até hoje. Nem recebeu nenhum “sim”, nenhum “não”, nem indicações a terceiros. “Somos absurdamente conservadores aqui no sul. Porto Alegre é, sem dúvida, a capital mais ‘fechada’ do país [em termos de oportunidade]. Ninguém dá espaço para ninguém. Te veem como concorrente e não como parceiro”, critica. A saída foi cavar um espaço próprio: junto com Nando Viana, tido hoje como um dos pioneiros da comédia stand up no estado, ele conseguiu ocupar as noites de segunda-feira do Zelig Bar, na Cidade Baixa, com o show “Eu ‘tava vindo pra cá”, que valeu para encorajar a dupla a levar a ideia adiante.

Nos moldes do que aconteceu com Rafinha Bastos, Nando Viana seguiu para São Paulo e Brasília e já passou por programas da MTV, pelo CQC e pelo Humor na Caneca, do Programa do Jô. Oliveira permaneceu em Porto Alegre e formou o Comédia de Galpão junto com Rafael Campos e Juan Araújo, que também é mágico. Foi ele quem sugeriu a Bottega a criação das sessões open mic, após ter participado da temporada 2012 do bar, para promover a abertura de espaços para iniciantes no ramo. Para o comediante, o maior entrave na popularização do stand up na cidade é a falsa ilusão de muitos proprietários de que as apresentações irão alavancar o lucro com consumação do bar da noite para o dia. “Eles não querem realizar um trabalho de divulgação deste gênero de comédia, não querem apostar. Eles querem que o show esteja lotado desde o primeiro dia. Querem bar lotado. Comandas cheias. E se não lotar, a temporada é cancelada”, lamenta.

Por enquanto, o tempo que levará ao aumento do interesse dos porto-alegrenses pelas performances depende da familiarização do público com outro estilo humorístico. “O povo gaúcho gosta muito de humor com personagem. O que bomba é o Guri de Uruguaiana [de Jair Kobe] e o Jorge da Borracharia [de Cris Pereira]”, observa Dudu Weber, que tem planos de conciliar o stand up com shows de personagem em parceria com outros comediantes. Tanto ele quanto Bottega citam o tradicionalismo como outro vício. “O stand up tem uma origem americana muito rica, que preza a originalidade e a autoria. Ninguém copia ninguém, não pode ter anedotas”, destaca o gerente do Bar da Mata. Para o futuro, outra reforma já está sendo considerada para acomodar melhor a plateia crescente.

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