17 de set. de 2013

Terapia de Risco: a possível despedida de Steven Soderbergh

Por Lauren Steffen

O diretor Steven Soderbergh anunciou sua aposentadoria aos 50 anos
A versatilidade de Steven Soderbergh é admirável. O cineasta frequentemente busca sair de sua zona de conforto, desafiando-se com produções complexas, saltando de um gênero a outro ou mesmo arriscando-se em projetos com orçamento nulo. Agora, Soderbergh surpreendeu ao anunciar sua precoce aposentadoria ao garantir que Terapia de Risco (Side Effects, 2013) será seu último trabalho para o cinema. Se isto for verdade, a despedida do diretor não terá sido embaraçosa, já que aqui ele realiza uma experimentação ousada, demonstrando certa coragem ao puxar o tapete sob as expectativas do público quanto ao tipo de filme que está vendo.




Escrito por Scott Z. Burns de Contágio e O Desinformante, o roteiro nos apresenta à jovem Emily (Rooney Mara), cujo marido Martin (Channing Tatum) acaba de deixar a prisão após cumprir pena devido a um crime de colarinho branco. Enquanto os dois buscam se adaptar à nova rotina, a garota passa a ter pensamentos suicidas provocados por uma depressão aparentemente antiga, o que a leva a conhecer o psiquiatra Jonathan Banks (Jude Law). Participando dos testes de um novo antidepressivo, Banks receita o medicamento para a garota. É então que uma tragédia possivelmente causada pelos efeitos colaterais da droga ocorre e a trajetória dos personagens sofre mudanças radicais, lançando uma nova luz sobre suas personalidades e motivações.

Construindo um universo no qual todos conversam em voz baixa e encaram os antidepressivos como um elemento obrigatório, Soderbergh (assinando a fotografia com o pseudônimo Peter Andrews) também é hábil ao investir numa escala de cores triste que, oscilando entre o amarelo e o cinza, surge desbotada e melancólica, isolando os personagens ainda mais uns dos outros e do mundo que os cerca. Com isso, o cineasta cria um retrato opressivo e verossímil da depressão e do estado de desesperança no qual se encontram suas vítimas.

Igualmente eficaz na montagem (que ele também assina, agora com o nome Mary Ann Bernard), Soderbergh cria um ritmo cuidadoso, assumindo assim o ponto de vista de Emily e sua percepção angustiante da lenta passagem do tempo. Da mesma maneira, o diretor aposta em instantes marcados pela obviedade (como a cena em que Emily vê o próprio reflexo deformado em um espelho), que funcionam por ganharem novos contornos à medida que a história se desenvolve.

Rooney Mara continua a crescer como intérprete ao criar uma personagem que, mesmo dividindo certas características de temperamento com sua personagem mais conhecida até o momento (a Lisbeth Salander de Millennium), consegue distanciar as duas performances para que estas se convertam em figuras individualizadas e complexas. Enquanto isso, Jude Law constrói o Dr. Banks como um profissional gentil, ético e verdadeiramente preocupado com os pacientes. Mesmo não hesitando em receber dinheiro de uma companhia farmacêutica para testar uma droga, o psiquiatra se esforça para que isso não afete seus clientes, informando-os inclusive de suas opções de tratamento. Fechando o elenco, Catherine Zeta-Jones e Channing Tatum fazem um bom trabalho com um tempo reduzido de atuação, encarnando personagens enigmáticos e desafiadores.

Não tenho a menor intenção de revelar os curiosos caminhos que Terapia de Risco passa a seguir a partir da metade da projeção, quando gradualmente adota um tom conspiratório e de suspense. Por um lado, isso exige do público uma readequação de suas expectativas iniciais, mas por outro intriga o suficiente para que sejamos convencidos de que as duas metades da obra se encaixam de forma orgânica.

O prazer ao fim de Terapia de Risco é ver que Soderbergh, nesse possível final de carreira, recusa o alarde do denuncismo e encontra um agradável equilíbrio entre o cinema comercial, de seus maiores sucessos de bilheteria, e o cinema mais autoral dos filmes de festival. Se ele parar mesmo de filmar, Terapia de Risco servirá como fiel testamento dessa versatilidade, pela qual Soderbergh sempre foi conhecido.

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