17 de set. de 2013

Comédia da vida real

Por Rodrigo H. L. Lorenzi

Foto: Divulgação
Adaptações de obras literárias, músicas e peças teatrais geralmente costumam ser alvo de opiniões controversas quando assistidas nas telas de cinema. Às vezes, os fãs ficam satisfeitos, às vezes, a parte técnica é priorizada, então é difícil conseguir um consenso entre os diferentes públicos. A peça teatral “Minha mãe é uma peça” é escrita, produzida, dirigida e interpretada por Paulo Gustavo, um dos talentos do humor brasileiro que vem sendo reconhecido nos últimos tempos fora dos palcos. E chegou a hora do monólogo dos teatros ir ao cinema. Elenco maior, público maior, produção mais desenvolvida... Mas será que dá certo?





Paulo Gustavo já tem um programa próprio na TV a cabo brasileira, o 220 Volts, em que interpreta vários personagens e geralmente são cortes rápidos e edição acelerada, valorizando os momentos da comédia, sem a necessidade de criar relações entre outros personagens ou lógicas mais complexas. É simples, é engraçado e funciona. Além disso, seu canal de vídeos do Youtube já acumula outras interpretações bem reconhecidas, mas também no formato mais curto e direto. Na peça em que foi baseado o filme homônimo, o humorista interpreta Hermínia, e durante todo o tempo é aquela personagem que conta vários episódios de sua vida com os filhos, Juliano e Marcelina, da convivência com os vizinhos e a relação com o ex-marido. Uma narrativa simples, tudo baseado na palavra e no discurso de Dona Hermínia. No cinema, a lógica permaneceu similar. A princípio, é uma história sendo contada aos poucos em que flashbacks de episódios engraçados vão acontecendo, mas em alguns trechos fica a expectativa de uma narrativa um pouco mais amarrada, com ritmo e mais acontecimentos; a noção de flashback se dissolve um pouco porque não existe uma diferenciação estética em todas elas (comum em outras obras) ou de tempo de duração dos episódios em relação à narrativa principal do filme. É notável a herança do teatro no filme, e não considero condenáveis essas explicitações de traços dos palcos, mas para quem estava acostumado com o modelo comercial da comédia brasileira, esse novo estilo híbrido apresentado por Paulo Gustavo causou, no mínimo, um pouco de estranheza. A conexão entre o enredo e o público, no cinema é mais complexa nesses momentos de silêncio, ou tomadas mais lentas, o que no teatro funciona melhor porque acaba criando uma atmosfera entre o artista e os espectadores.

O medo de perder a dinâmica que dona Hermínia tem nos vídeos e no teatro some quando somos cativados pelo episódio hilários narrados de maneira tão legítima por aquela dona de casa. A linguagem, o tom de voz, a linha de pensamento, tudo ilustra muito bem a mãe superprotetora brasileira. É incrível o nível de identificação que as pessoas têm com as atitudes e com os ambientes criados pelo diretor André Pellenz, com auxílio do co-roteirista Fil Braz e a colaboração de Rafael Dragaud. O cinema brasileiro ganhou uma nova aparência, principalmente na comédia. Novas caras e um novo estilo que aparentemente ganharam o público também, afinal, no final de semana de estreia, o filme contabilizou mais de 410 mil espectadores. O elenco traz ainda figuras conhecidas da comédia, como Samantha Schmutz (Valdeia, a empregada), Herson Capri (o ex marido) e Ingrid Guimarães (a madrasta).

Apesar do tom engraçado durante o filme inteiro, há também a preocupação de abordar alguns assuntos mais delicados e sem cunho no humor, mas que fazem parte das preocupações que uma mãe de dois adolescentes tem. A história ganha profundidade com esse toque dramático, mas recupera a comédia logo em seguida sem se fazer agressiva ou superficial. E o melhor de tudo? Poder ver, lá nos créditos, a inspiração real de Paulo Gustavo para criar a personagem mais carismática dos últimos tempos no cinema nacional. A Dona Hermínia da vida real é tão engraçada quanto à fictícia, ou quem sabe até mais, o que acaba legitimando e trazendo para perto do público o filme inteiro como obra e peça de entretenimento.

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