19 de dez. de 2011

As histórias de Cardoso

Por André Araujo

atenção: não nos confundamos. consultor criativo freestyle, viking rastafari extraordinaire, random caps locker VISIONÁRIO e terrorista poético provinciano com toques de EGOTRIPPER só existe UM: o verdadeiro CARDOSO; ou andré czarnobai para aqueles que viveram na selva (ou fora de POA) pelos últimos 10 anos.

figura um tanto recorrente de CENA CULTURAL do extremo sul brasileiro, CARDOSO pode ser considerado, paradoxalmente, um ser OBSCURO. não no sentido de misterioso ou RECLUSO, mas sim naquele sentido mais ADORNIANO de INEXPLICÁVEL. de acordo com o próprio, até hoje permanecem sob sérias suspeitas os motivos pelo qual o “ruivo do garagem” (alcunha de seus tempos de boemia) se tornou um dos expoentes da produção cultural independente (ou nem tanto) de porto alegre. se pensarmos em termos GENEALÓGICOS, quase todos os acontecimentos relevantes (na opinião do próprio) desse nosso INFANTE novo século que tiveram como cenário os PAGOS desse estado, cardoso esteve envolvido. desde o finado e saudoso mailzine, que carrega em seu título o nome dessa figura, CARDOSONLINE, até os mais vanguardistas projetos da velha mídia gaúcha, o vômito constante de palavras e gestos de cardoso esteve diretamente envolvido. reiteramos, em sua própria opinião.


é sempre bom voltar a esse ponto: na opinião de cardoso. essa frase vai aparecer muito daqui pra frente, então já vamos suprimi-la em nome de um parágrafo explicativo: cardoso fala, e muito. inclusive, tem a sua própria pessoa em altíssima conta. não há como filtrar os seus possíveis exageros num pretenso perfil, pois, são justamente eles que dão-lhe o traço mais marcante. cardoso é um homem hiperbólico, e para lhe fazer jus, deixaremos de lado as expressões contidas para poder mergulhar com justiça na eterna EGOTRIP que é sua vida e personalidade.

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não interessa onde ou quando cardoso nasceu (porto alegre, 1980), ou como foi a sua infância, pois isso diz respeito à ANDRÉ CZARNOBAI, um homem que já não mais existe. a PERSONA se assim podemos dizer de CARDOSO nasce mais ou menos logo após o término do ensino médio, quando foi trabalhar para uma empresa que comercializava artigos médicos. era representante comercial, e a sua INEXPLICÁVEL influência sobre os donos de clínicas e hospitais do estado o alçaram a uma posição de destaque no meio aparelhístico hospitalar. cardoso vendia uma “máquina que faz BIP” (ref.cit. monty python e o sentido da vida) como ninguém. não sabia absolutamente NADA sobre aquilo que vendia, mas sua habilidade com as palavras e o recém descoberto carisma inabalável o fizeram acreditar que, bem, se conseguia vender equipamentos que custavam o PIB da nigéria em 1982 para QUALQUER UM sem esforço, poderia fazer outras coisas mais divertidas com a mesma facilidade. tendo consciência então, que num mundo pós-moderno o que conta é a retórica e o freestyle, CARDOSO se mudou para o lugar onde melhor poderia exercer essas atividades EM PROL da humanidade: na fabico, é claro.

como vivíamos em um período turbulento da história do país, com o sucateamento geral de todo e qualquer orgão público, a UFRGS é claro que não se safou. e como todo bom intelectual sabe, a única maneira de fazer as coisas melhorarem é através da REVOLUÇÃO. se der preguiça, uma greve basta. e como todos os estudantes já estavam na graça eterna de seus progenitores por ter alcançado o ELDORADO do sul do país, o ócio criativo por natureza e imposto por condição, gerou a descoberta do instrumento perfeito para esse tipo de situação: A INTERNET.

cardoso foi um visionário, sem dúvidas. ao notar o potencial de DISSEMINAÇÃO IDEALISTA imanente ao novo meio, se jogou como um porco na lama nos MEANDROS mais obscuros da nossa querida www. e desse mergulho no depositório das entranhas da humanidade que ainda estava apenas tomando forma, EMERGIU o CARDOSONLINE.

o cardosonline consistia num fanzine por e-mail. nada mais simples, nada mais óbvio, nada mais perfeito para a época. com uma coletânea de textos simples e que refletiam a vida nas “”””grandes”””””” cidades no início do século XXI, logo o cardosonline caiu nas graças do público UNDERGROUND do país todo. o que começou como uma brincadeira de cardoso para passar as horas, em menos de um ano se tornou o veículo referência para uma nova geração que se moldava a partir do descobrimento da internet. os colunistas, que na época não tinham mais o que fazer a não ser entrar na onda desse “ruivo hiperativo”, hoje são escritores de renome, professores universitários, jornalistas bambambans da grande mídia. o cardosonline catapultou a vida de todos os seus colunistas e definiu suas vidas a partir dali. e me perguntam o que aconteceu com cardoso? bom, cardoso continuou tocando o seu FREESTYLE LIFESTYLE.

pode parecer estranho que o grande feito de cardoso, ou pelo menos o que lhe rendeu mais reconhecimento, não lhe tenha sido mais frutífero. cardoso não se tornou um grande escritor, apesar do evidente talento que demonstrava em suas colunas. também não se tornou um empreendedor dos meios de comunicação, mesmo que ainda tenha o mesmo TINO que teve quando criou o cardosonline. o que aconteceu com cardoso? perguntam mais uma vez. CARDOSO é um homem que vive nas brechas do sistema. jamais poderia se tornar a grande personalidade que a sociedade nos incita a ser. o próprio cardosonline, guardadas as proporções subsequentes de sua fama, sempre foi algo para os raros que o descobriam sem querer. CARDOSO não é um homem que vive para cravar seu nome na história, não do modo como estamos habituados pelo menos. cardoso é um artista sim, mas um artista da vida.

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é possível fazer aqui uma leve digressão a respeito dessa figura. alguém uma vez disse que os artistas abandonam a vida em nome da arte. não se pode viver e criar ao mesmo tempo. acho que foi o pessoa. o que é correto até certo ponto. nessa perspectiva, a arte se torna um substituto da vida, uma máscara que é laborosamente esculpida, de forma a dar uma perspectiva ao dia-a-dia. já nietzsche dizia que a arte não é mais que a ilusão que torna possível a vida. é mais ou menos por ai, mesmas ideias. mas o nietzsche também disse algo a mais, que se aplica perfeitamente ao MOMENTO. ele dizia simplesmente: torna-te a ti mesmo. não conhece-te a ti mesmo, como se nossa personalidade fosse algo já existente e a nossa função na vida seria buscá-la. pelo contrário, nossa personalidade, ou nossa vida, é justamente a nossa obra de arte mais completa. a mais pura ilusão que torna possível a vida é tratar a vida como arte. ENKRATEIA diria depois foucault, ou a estética da existência. viver como se pinta uma tela.

característica do pós-modernismo, existem poucos que podem se enquadrar plenamente nessa perspectiva. muitos os chamam de playboys, bon-vivants, etc. cardoso é um deles, mas um juízo de valor dessa magnitude, julgar a VIDA de uma pessoa, parece ser um tanto quanto MEGALÔMANO demais. digamos apenas que cardoso é uma espécie de espírito dos tempos, um mestre na arte do bem viver. como atestar tal afirmação? bem, uma conversa de quatro horas na lancheria do parque não deixa a menor dúvida disso.



quando uma entrevista é marcada, se espera que o entrevistado vá discorrer sobre aspectos de sua vida que são considerados relevantes para o PÚBLICO. um escritor falará de suas obras, uma ativista de sua militância e assim por diante. quando me encontrei com cardoso, tudo o que ouvi foram histórias. experiências com psicoativos, causos acadêmicos, anedotas sexuais. foram quatro horas de frente com o legítimo narrador benjaminiano, o que me fez refletir sobre aquilo que falei nos parágrafos anteriores. o grande feito de cardoso é sua própria vida, nada mais nada menos. e que vida, posso exclamar.

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cardoso em 2006 foi para belém dar uma oficina de literatura e internet. pensou que iria encontrar na sala de aula meia dúzia de estudantes de comunicação e de letras, mas foi surpreendido por verdadeiros nativos amazônicos. “caboclos mesmo cara, tinha que ver. saídos da reserva!”. mas todos obviamente familiarizados com as bonanças da internet, ávidos pelas maravilhas do mundo moderno. finda a oficina, um deles (“o mais cabreirão”) abordou cardoso: “eu sou xamã. tu tem uma energia de xamã. quer fazer uma PAJELANÇA comigo hoje a noite?” convite estranho, mas quando se está na amazônia, se abraça tupã. dirigiram até uma cidade vizinha no carro mofado pela umidade sufocante do pará. foram os dois para uma clareira, no meio da floresta que não era muito longe da cidade. sentaram um de frente para o outro e o xamã tirou uma bolsa de couro de seu casaco, colocando o conteúdo em um longo cachimbo artesanal. “dá uma tragada profunda nisso ai e pensa na coisa que mais tá incomodando no momento”, disse o caboclo. cardoso obedeceu, e quando abriu os olhos depois da tragada, o pajé já não era mais ele. cardoso estava numa outra floresta, rodeado por muitos índios, e o caboclo vestia um traje típico de rituais. cardoso, sem achar nada daquilo estranho, começou a conversar com o pessoal, numa língua que ele não conheciam as que aparentemente fazia o maior sentido. discutiram questões cotidianas e existenciais, numa cena bizarra onde um ruivo branquelo de dois metros de altura discute sua vida suburbana com deuses indígenas frutos de sua imaginação. quando cardoso acordou, o pajé lhe questinou sobre o que ele lembrava. “eu não lembrava de nada tá ligado, era tudo numa língua estranha. falei pra ele. sabe o que ele me respondeu? daqui uns anos vai fazer sentido”. “e faz sentido?” perguntei ávido por um pouco de esoterismo. “não sei, eu nem penso muito nisso na verdade”.

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